Preguiça até para sentir?
Fechados para balanço por motivos de: já deu
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é geracional ou geral essa preguiça de tudo? | foto: oticacotidiana - feito com IA |
Tem dias em que tudo o que a gente quer é um abraço que dure o suficiente para que a chuva passe sem nos deixar molhados. Mas entre o aguaceiro que cai – e que nos faz parar para rever a rota mesmo sem querer – começamos a pensar demais: nas coisas que deram certo, nas que desandaram e no quanto a gente precisou aprender pelo caminho, nem sempre da forma mais tranquila. E só de ter aprendido alguma coisa sem surtar completamente já parece um baita feito.
Mas, no fundo, parece que a gente anda tomado por uma preguiça estranha. Uma preguiça que não tem nada a ver com ficar deitado no sofá num domingo à tarde maratonando séries duvidosas, mas uma exaustão emocional. Preguiça de se envolver, de conversar, de se abrir, de construir algo. A gente tem preguiça para começar um relacionamento e, pior, para sair de um também. Preguiça de explicar o que sente, de escutar o outro, de tentar entender. A gente quer estar curado sem passar pela cura. Como se tudo desse muito trabalho. E talvez dê mesmo.
Outro dia vi alguém no Twitter dizendo que se sentia muito à vontade em dar ghosting nas pessoas. Sim: de sumir, desaparecer das conversas, evitar qualquer tipo de laço depois que a pessoa desistiu da relação subitamente. E por mais absurdo que pareça, aquilo me fez pensar. Porque essa vontade de desaparecer talvez seja só mais um sintoma da exaustão e da nossa dificuldade de ter conversas mais maduras. Será que a gente ainda sabe como conversar nessa época em que podemos conversar a qualquer hora? Tá todo mundo – que tenta seguidas vezes construir algo com alguém – tão sobrecarregado emocionalmente que até manter uma troca básica virou esforço demais. A gente quer relações leves, que caibam numa trend do TikTok, mas esquece que a vida real tem mais do que 30 segundos.
É curioso como, mesmo exaustos, seguimos querendo coisas grandes: amor, estabilidade, cumplicidade. Mas será que a gente ainda sabe como se constrói tudo isso? Será que estamos dispostos? Parece que, ao longo do caminho, fomos abandonando partes importantes de nós mesmos. Coisas que antes pareciam essenciais e hoje viraram “tanto faz”. A gente vai cedendo espaço, deixando de lado, perdendo paciência. E tudo isso sob o disfarce da praticidade, quando na verdade pode ser só medo e cansaço.
O resultado é um monte de relação no modo automático. A gente não fala o que sente, mantém vínculos por comodismo ou medo de recomeçar, e vive nesse ciclo de “quases”. Quase amor, quase afeto, quase conversa sincera. Quase tudo. E, no fim das contas, a gente se acostuma a viver assim: com relações rasas, trocas interrompidas e um constante esforço para não se deixar afetar demais, em alguns casos até envolvendo outras pessoas em novas relações só para não ter que pensar sobre o que se passou.
Claro que existe motivo. A gente já esbarrou em gente ferida que fere sem dó, em gente que pula de relação em relação deixando estilhaços pelo caminho. E isso cansa. Traumatiza. Faz a gente querer fugir. Mas até quando? Até quando a gente vai aceitar essa lógica de distanciamento emocional, de superficialidade travestida de liberdade?
A pergunta que me vem é essa: será que a gente perdeu mesmo a batalha para a preguiça de sentir? Será que desistimos de nós mesmos, da profundidade, da conexão verdadeira? Ou ainda dá tempo de fazer diferente?
Eu sei, está todo mundo cansado. Sobrecarregado. Tentando manter a vida funcionando enquanto o mundo desmorona por dentro e por fora. Péssima hora para ter crises emocionais no mundo apocalíptico em que todo dia tem um evento histórico, né? Mas talvez ainda dê tempo. Talvez ainda exista espaço para construir algo novo, dentro da gente e com os outros. Só que, para isso, a gente vai precisar, antes de tudo, sair da inércia. Da preguiça emocional. Do quase, das relações e caminhos incompletos.
E aí eu te pergunto: para você, o que é mais difícil hoje? Sair dessa preguiça, com esse corpo, com essa idade, tendo passado por tudo que passou, ou continuar fingindo que ela não está te consumindo?
Talvez a maior coragem hoje seja sentir; mesmo com medo, mesmo cansado. Reaprender a estar presente, a escutar com atenção, a construir algo que não caiba em 30 segundos, nem se resuma a reações rápidas. Talvez a gente não precise estar 100% bem para tentar de novo, só disposto o suficiente para não desistir de vez. Porque, no fim, o que machuca não é sentir demais, é viver sempre pela metade e tentando entender o sentido de tudo que não tem fim e mal consegue sair do começo.
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