Por que a grama do vizinho é mais bonita?
| foto: oticacotidiana feito com IA |
Passaram-se dias, meses, e nada. Ele olhava e tentava replicar o que conseguia entender. Nada. Tudo que ele queria era construir algo de que pudesse se orgulhar. Anos se passaram, até que ele desistiu de vez. Comprou grama sintética e, mesmo ela estando sempre verde, ainda assim enxergava que era mais feia do que a do vizinho.
Frustrado, o homem decidiu se mudar. Comprou um apartamento no centro da cidade, onde tudo o que tinha ao seu redor eram prédios e a poluição dos carros. No centro, ninguém tem tempo para nada, e ele, finalmente, estaria certo de que não se ocuparia com a frustração de não ter um jardim para se orgulhar. Estava seguro de que ali nada poderia competir com a sua capacidade.
Em um domingo de sol, ele observou, da sua janela, uma idosa do outro lado da rua cuidando de um minijardim na varanda de um dos prédios do bairro. Havia naturalidade nela e, entediado, ele passou a observá-la, sem segundas intenções. Foi então que percebeu certa frieza na ação da mulher: ela arrancava pela raiz e jogava no lixo todas as plantas que estavam feias ou mortas.
Tudo, então, se encaixou.
O vizinho, que ele invejou por tantos anos, sempre arrancava pela raiz a grama que envelhecia e ficava feia, mas ele nunca havia se atentado a esse detalhe, porque tudo que ele queria era manter a aparência de um jardim cheio. Ele, enfim, percebeu que, quanto mais deixava a grama morta e feia, mais contaminava as saudáveis que estavam ao redor, e nada florescia com beleza. Dessa forma, jamais teria um jardim como o do vizinho.
| foto: oticacotidiana feito com IA |
Quantas vezes a gente precisa arrancar pela raiz algo e evitamos por temer o vazio que ficará ali até que algo novo possa ocupar? Quantas vezes evitamos puxar algo de dentro de nós, de uma vez, para tirar do coração? Vai doer, vai arder, literalmente. Mas, quando a dor cessar e a ferida cicatrizar, teremos novas chances de viver algo verdadeiramente novo, sem os resquícios da experiência e da dor passada.
O homem demorou, mas percebeu que não adiantava fingir que estava cuidando da própria grama. Era necessário que ele mesmo cuidasse dela, e ninguém jamais poderia fazer isso por ele. Uma vida inteira precisou passar para que o homem, enfim, pudesse se observar.
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