O conselho

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O silêncio tem o poder de traumatizar e tocar fundo a alma, tanto quanto um grito que invade os nossos ouvidos, nos jogando num lugar assustador e desconhecido. Diferenças à parte, lembro-me de sentir o silêncio naquele dia em que conversamos. A rua estava movimentada, havia guardas de trânsito e motoristas buzinando assustadoramente, enquanto isso, o tempo seguia lento ao atravessarem uma senhora, pacientemente caminhando. Um braço apoiado no andador e outro no acompanhante. Um passo de cada vez. Em meio a tudo isso ouvi você me dizer:

- ‘Acabou! Vá viver sua vida de uma vez!’.

No momento em que minha alma sentiu o tom dessas palavras, ela se desnudou por inteiro. De repente, não havia um único som a ser escutado, apenas o som do silêncio. Ele ecoava insistentemente em mim e me jogava em direção a um lugar assustadoramente desconhecido: o novo. O que eu deveria fazer agora que estava livre? Que caminhos deveria seguir agora que estou sozinho? “Vá viver sua vida de uma vez” insistentemente essa frase me tocava, me perturbava e jogava em direção a algo que estava posto, mas eu não tinha coragem de enfrentar: o meu verdadeiro eu.

Quem seria eu, afinal de contas, diante desse confronto de viver a própria vida? E mais: o que poderia encontrar nesse caminho ao finalmente me dar conta de que tenho mesmo que vivê-la? Num lapso do tempo em que ele se paralisou por completo, em meio a esse insistente silêncio, me encorajei e levantei. Levantei e caminhei em direção a algum lugar confortável em que eu pudesse dar espaço para sentir e expor as minhas vulnerabilidades. Seguia sentindo o impacto. O que ninguém tinha me contado é que quando entramos em um túnel em direção ao nosso eu interior, demora um tempo para encontrar a luz e a saída até a ponta que estava escondida pela escuridão.

Hoje, passado o tempo que passou, relembro desse dia em que senti o que era o silêncio para o chamado para viver a própria vida. Enfim, vivi. Enfim, segui o conselho. No início, de um jeito meio amargo, sem esperança. Fui viver a minha vida catando os pedacinhos que restaram. Busquei semear novos pedaços. Tendo passado por tudo que passei até chegar até aqui, sinto um imenso sentimento de orgulho pelas descobertas. Sinto a cura e o prazer do encontro comigo mesmo. Ir viver a própria vida é algo maravilhoso, um processo único e transformador.

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