Sete, Quatorze, Vinte-e-um
Próximo ao velho
rádio estava Sete e suas músicas preferidas estavam tocando. Dançava e se
envolvia com tudo àquilo, parecia estar em casa. Quatorze lançava olhares que
traduziam vergonha e desprezo ao comportamento de Sete. Censurou cada passo do
jovem. Vinte-e-um olhara a cena encantado. Analisava profundamente como se
buscasse por pedaços perdidos, ou por justificativas para os seus atuais
dramas. O ambiente: uma velha estrada cercada de galhos secos e árvores altas.
O conjunto lembrava um quadro antigo, ou melhor, uma representação de algo que
não voltará. O céu: limpo, sem nuvens, como talvez a consciência dos três.
Apenas o pálido e conhecido azul, apenas o instintivo desejo em ser feliz
gratuitamente. No horizonte, o cheiro da terra úmida de uma estrada sem
qualquer tipo de sinalização. A terra perfeita para brotar vida.
Sete parecia
esperar por alguma coisa, ou talvez alguém. Repetia os seus pensamentos
sussurrando, como se fosse um segredo pedido para alguém o ajudar a
materializar. Parecia atônito e os olhos brilhavam mais do que qualquer
estrela. Acreditava em tudo que via, e entregava a sua atenção ao que lhe
convidava. Por alguns momentos se perdia acompanhando o voo dos pássaros acima
da sua cabeça. Fazia perguntas como se estas pudessem ter respostas tão
inocentes, quanto a sua visão de tudo. Tinha fome de conhecimento mais do que
qualquer um ali. Era o mais vivo dos três, porém era o que esperava por algo
maior para te guiar. Era o mais frágil. Ainda sim, conseguia imaginar o final
dessa estrada. Duvidava de muitas coisas, mas sabia que no final encontraria o
que sempre desejou. Era a certeza que o mantinha ali, preso naquele lugar com
dois estranhos conhecidos.
Quatorze achava
o Sete um iludido. Em alguns momentos cheguei a crer que ele o odiara. Para
ele, o que está a sua frente é somente o que consegue ver. Cético com os outros
e com os próprios sentimentos. Acha que sabe de muita coisa sobre a vida, pouco
pede conselhos, resmunga, pouco fala das expectativas. Fechou-se apenas ao seu
mundo. Sente tudo em dobro e com mais intensidade do que os outros. Seus olhos
são tão ricos de energia, que se perde na maioria dos seus pensamentos. É
hiperativo de natureza, mas não consegue completar nada. A inquietude é o seu
principal parceiro, contudo, ele apenas deseja. Não há determinação suficiente
para materializar. Imediatista e autossuficiente, ria das próprias piadas.
Mantinha-se preso às mesmas certezas das incertezas. Medo? Talvez.
Principalmente daquilo que não tem controle. No fundo Quatorze era o que tinha
os seus sonhos e medos equilibrados, por isso não conseguia alcançar voos altos
e pouco via além daquela estrada.
Vinte-e-um
analisava tudo. Parecia beber da sabedoria e da superioridade. Percebia as
reações, como se pudesse tirar algo dali. Achava Quatorze arrogante, mas
admirava sua autossuficiência e a desejava. Via em Sete um brilho capaz de
iluminar qualquer escuridão. Àqueles olhos dificilmente sairão de sua
imaginação. O seu semblante talvez demonstrasse confusão, no entanto, ele estava
envolvido com estes dois seres, como se os conhecessem de outros tempos.
Vinte-e-um sabia de muitas coisas, mas o que carregava nas costas deixara seu
olhar mais opaco. No fundo desejava ver além da estrada, como o Sete, e ter a
energia grandiosa do Quatorze. Queria também a certeza que o Sete tem, de que
no final da estrada encontrará o que deseja.
Não sabiam como
chegaram até àquele lugar, não demonstravam pânico nem histeria. Velhos conhecidos. Era por sentimentos
que se aproximavam e se afastavam. Vinte-e-um tentava adiantar as coisas para
Sete, Sete provocava Quatorze com o seu poder imaginativo. Vinte-e-um parecia
querer resgatar algo que está fraco, mas há em abundância nos outros dois. E a
estrada continuara ali, pronta para ser trilhada por estes três. Sete sabia o
que queria encontrar, Quatorze não queria fazer esforço para sua realização,
Vinte-e-um desejava não perder mais tempo, mas tinha medo das suas próprias
escolhas e dos riscos.
Os três estão
juntos e àquela velha música ainda voltará a tocar, ao passo que encontrarem
outros personagens no meio dessa estrada. São sábios e dependentes um do outro.
Em um determinado momento vão se mesclar. Sete, Quatorze e Vinte-e-um
permanecem caminhando em busca do equilíbrio e da realização. Ou ao menos a
vivência plena.
Footnote:
Reler as minhas composições é um processo introspectivo e complexo de
encontro das superações.
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